O dia 2 de agosto de 2011 entrou para a histórica médica de Jacarezinho e do Norte Pioneiro. Ontem, uma equipe formada por dois cirurgiões gerais do Hospital São Vicente, localizado em Curitiba, realizou a primeira captação de órgãos da região, no centro cirúrgico da Santa Casa da Misericórdia.
Após um procedimento de cerca de três horas de duração, os médicos cirurgiões Diogo Kfouri e Alysson Matioski conseguiram captar o fígado, os rins e as válvulas cardíacas de um homem de 47 anos, que teve morte cerebral constatada na última segunda-feira, após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico – quando não há hemorragia.
Para conseguirem chegar a tempo de fazer o procedimento, os médicos foram transportados em um avião bimotor. O voo saiu de Curitiba por volta das 12 horas e aterrissou no Aeroporto Estadual de Ourinhos (SP) às 13 horas. O procedimento cirúrgico começou por volta das 14 horas, sendo finalizado por volta das 17h30.
Segundo Kfouri, após o procedimento de captação, os órgãos seriam transportados diretamente para a Central de Transplante de Órgãos do Estado, localizada em Curitiba. “Depois de retirados os órgãos precisam ser transportados o mais rápido possível. O transplante do fígado pode demorar no máximo 11 horas depois de captado. Já os rins suportam até 24 horas. As válvulas cardíacas já são mais resistentes e suportam mais tempo de intervalo entre captação e transplante”, explicou o cirurgião, apresentando o porquê da urgência tanto do procedimento de coleta, quanto do transporte dos órgãos.
Na central de órgãos, o material passa por alguns exames e especialistas vão identificar os receptores que tenham maior compatibilidade com o doador. “Os órgãos são submetidos a exames, como o de tipo sanguíneo, por exemplo. Todos os casos de receptores que encontram-se na fila de espera são analisados e o que tiver maior grau de compatibilidade recebe o órgão”, completou Matioski.
Depois de retirados os órgãos vitais, o paciente passou por mais um procedimento cirúrgico, dessa vez conduzido por profissionais do Banco de Ossos do Hospital de Clínicas de Curitiba. A equipe, formada por dois técnicos e um ortopedista trabalharia na remoção das estruturas ósseas e dos tendões dos membros superiores e inferiores do paciente. A previsão era que a cirurgia fosse iniciada por volta das 18 horas de ontem, e a expectativa da equipe era que todo procedimento durasse em torno de quatro horas.
Segundo o médico ortopedista Tiago Fuchs, responsável pelo procedimento de ontem, a retirada de ossos e tendões funciona exatamente como uma cirurgia. “É uma cirurgia, com todo o processo de assepsia. Hoje (ontem) vão ser retirados os ossos e tendões dos membros inferiores e superiores do paciente”, explicou.
Depois de retirado e captado, o material é encaminhado ao Banco de Ossos. “Posteriormente todo esse material passa por uma série de exames laboratoriais, para constatar se não há infecções ou se o paciente não sofria de doenças contagiosas”, completou.
Ainda depois de todo esse processo, o material é congelado a -85ºC e fica em quarentena, para apenas depois ser reaproveitado em enxertos, por exemplo. “Esses ossos e tendões são utilizados em cirurgias reconstrutivas, por dentistas, para suprir tumores ou para repor perda óssea. É uma opção biológica e geralmente apresenta muito menos rejeição do que próteses artificiais”, finalizou. O procedimento de coleta dos ossos e tendões não foi concluído antes do encerramento dessa edição.
Exemplo a ser seguido
Provedor da Santa Casa da Misericórdia, o bioquímico Paulo Diniz elogiou a iniciativa da família do paciente que teve os órgãos captados na tarde de ontem. De acordo com Diniz, esse tipo de procedimento poderia ter sido feito no local desde outubro do ano passado, quando a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital ganhou novas alas e quando uma nova equipemédica foi composta, respeitando as exigências e protocolos do Ministério da Saúde para a realização de captação de órgãos. “Foram contratados mais enfermeiros, um psicólogo, um assistente social e um neurocirurgião. Além disso, todos os profissionais passaram por um curso de captação. Só depois disso tudo é que o Ministério da Saúde nos autorizou para que o procedimento fosse feito aqui”, explicou Diniz.
Porém, de lá pra cá exatos 11 meses se passaram até que a primeira família autorizasse a coleta. “É de se admirar. Essa família é uma prova de cidadania. Pelo menos três vidas podem ser salvas com o transplante desses órgãos”, disse.
O diretor administrativo do hospital, Nelson Tolotto também ressaltou a importância da atitude da família, ao autorizar a doação de todos os órgãos. “Essa família serve de exemplo. É muito emocionante presenciar uma atitude dessas”, falou. “Essa atitude pode incentivar que outras famílias, mesmo que se tratando de um momento difícil, entendam e autorizem a doação de órgãos”, finalizou Diniz.
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